O livro O Amor de uma Boa Mulher, publicado pela Companhia das Letras e traduzido por Jorio Dausteré, é a reunião de oito contos da autora Alice Munro: Jacarta, A Ilha de Cortes, Salve o ceifador, As crianças ficam, Podre de rica, Antes da mudança, O sonho de mamãe e o primeiro que dá título ao livro. Distribuídos em 373 páginas, todos os textos apresentam uma visão feminina e, por vezes, desagradável do mundo.
Neles, a autora aborda temas polêmicos como aborto, drogas, casamento, filhos, entre outros. As personagens principais são de diversas faixas etárias e, apesar da temática um tanto feminista, é recomendável que os homens dediquem-se à leitura da obra para tentar entender um pouco dos seus medos e angústias.
O livro foi originalmente lançado em 1998 e a autora utiliza como cenários pequenas cidades do Canadá, sua terra natal. O leitor encontra seres marginalizados e mulheres que desejam, acima de tudo, encontrar o amor e a liberdade.
“Você sabe como Rosemary conheceu Ted?”, Karin perguntou. “Numa parada de ônibus, quando chovia e ela estava passando batom.” Teve então que voltar atrás e explicar que Rosemary se pintava na parada de ônibus porque seus pais não sabiam que ela usava batom – algo proibido pela religião deles, assim como filmes, sapatos de salto alto, danças, açúcar, café e, evidentemente, álcool e cigarros. Rosemary estava cursando o primeiro ano da universidade e não queria parecer carola. “Ted era professor assistente”.
(Trecho extraído do conto “Podre de Rica”)
Alice cria personagens que transitam entre angústias do cotidiano e grandes acontecimentos, trazendo à tona as revoluções internas de seus personagens. Com invejável sagacidade, constrói e desconstrói a história, pontuando mudanças repentinas entre o espaço e o tempo, um estilo desafiador para o leitor menos atento (eu tive que reler alguns parágrafos mais de uma vez!).
As personagens passeiam entre os dias atuais e os anos antes da Revolução Sexual e da queima dos sutiãs, momento em que a atuação profissional feminina se restringia apenas a ser dona de casa e cuidar dos filhos.
A meu ver, um dos grandes méritos da autora é conseguir fazer o leitor contextualizar o ambiente onde se situa uma personagem com poucas palavras sem grandes devaneios. Eu, particularmente, tenho dificuldades com contos. E, no momento em que me apego ao personagem e crio “laços afetivos” com a trama, ela termina.
“Mamãe estava diante de uma grande janela encimada por um arco, daqueles que se encontram nas mansões ou em antiquados edifícios públicos. Dali descortinava gramados, moitas e arbustos, cercas vivas, jardins e árvores, tudo coberto por montes de neve ainda não perturbados ou nivelados pelo vento.”
(Trecho extraído do conto “O sonho de mamãe”)
O livro é uma viagem pelos sentimentos femininos, por um universo com grande potencial a ser explorado pela literatura, porém pouco conhecido pelos homens. Infelizmente, ainda em pleno ano 2016, temos que conviver com histórias de abandono e violência contra o sexo feminino que é vendido, pela grande mídia como frágil, mas que, na verdade, muitas destas “frágeis mulheres” desconhecem a força que têm.
A autora
A escritora canadense Alice Munro nasceu na província de Ontário, em 1931. Venceu, em 2013, o Premio Nobel da Literatura, atribuído pela Academia Sueca, que nela reconheceu um “mestre do conto contemporâneo”. Pela primeira vez, o prêmio foi destinado a um escritor especializado em contos. Alice já recebera alguns dos mais importantes prêmios literários, incluindo, em 2009, o prestigiado Man Booker International Prize.
Nascida numa família de criadores de raposas, a autora começou a escrever na adolescência, tendo publicado o seu primeiro conto, The Dimensions of a Shadow, em 1950, quando frequentava a universidade. Ao mesmo tempo, ia ganhando dinheiro em empregos ocasionais, trabalhando em restaurantes, na apanha de tabaco ou como bibliotecária.
Dona da livraria mais famosa de seu país e de uma das carreiras mais respeitáveis da literatura de língua inglesa, é autora de diversos livros de contos, traduzidos para mais de dez idiomas. Alice tem mais dois livros de contos publicados pela Companhia da Letras, Felicidade Demais e Vida Querida.
Informações da bibliografia:
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Site da Companhia das Letras: clique aqui.
Para quem quiser saber mais:
Sobre a Alice Munro: clique aqui.
Sobre a Companhia das Letras: clique aqui.
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